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Pentecostalismo Reformado e o Dom de Línguas - Sermão de 13/08/2023

Atualizado: 31 de ago. de 2023




Pois quem fala em línguas fala apenas com Deus, pois ninguém mais o entende, e em espírito fala verdades ocultas.Mas aquele que profetiza fortalece, anima e conforta os outros.Quem fala em línguas fortalece a si mesmo, mas quem profetiza fortalece toda a igreja.1 Coríntios 14:2-4


Introdução


Hoje, ao navegar na internet, em especial entre o conteúdo promovido por irmãos reformados "de redes sociais", há um vasto material produzido para questionar a atualidade da experiência de falar ou orar em outras línguas.


Infelizmente, uma boa parte dos cristãos bíblicos quer justificar seu cristianismo simplemente afirmando que essa prática cessou na era dos apóstolos. Para muitos deles, o problema do evangelicalismo resume-se nisso.


É uma lástima!


Esse tipo de cristão ignora o silêncio das Escrituras sobre o tema e os diversos testemunhos históricos sobre avivamentos onde esse dom se manifestou.


Por outro lado, somos testemunhas de décadas de abusos e esquisitices praticadas por igrejas locais que super valorizam essa experiência como se ela fosse o selo que autentica uma genuína vida espiritual. Ver crentes orando em línguas em lives de revelação é uma das coisas mais bizarras que já presenciei na minha vida.


A pergunta que fica é a seguinte: como nós, pentecostais reformados, nos posicionamos nessa grande Babel?


Não tenho a pretensão de ser exaustivo e com humildade, quero apenas ler a Escritura e refletir com vocês oj que ela tem a nos dizer sobre o tema.


Sendo um cristão que ora em outras línguas há mais de 25 anos, não quero deixar minha experiência ser o filtro que determina o que é verdadeiro ou não, mas quero submeter minha devoção à doce voz da Escritura, para dessa forma não ofender a santidade de Deus e muito menos apagar o Espírito em minha experiência devocional e comunitária.


Vamos lá!





O contexto do dom de línguas na Escritura


Citando Wayne Gruden, "o fenômeno de falar em línguas acontece exclusivamente na era da nova aliança". Antes da queda do homem no Éden, não era necessário um dom dessa natureza, uma vez que havia um único idioma no Jardim.


A história da redenção seguiu seu curso após a entrada do pecado do mundo até o catastrófico evento da Torre de Babel, onde Deus confundiu os idiomas humanos para evitar que uma nova rebelião generalizada da nossa raça acontecesse.


"Vejam!", disse o Senhor. "Todos se uniram e falam a mesma língua. Se isto é o começo do que fazem, nada do que se propuserem a fazer daqui em diante lhes será impossível. Venham, vamos descer e confundi-los com línguas diferentes, para que não consigam mais entender uns aos outros. Gênesis 11:5-7

Deus então escolheu a nação de Israel para ser o seu povo peculiar. Toda essa nação tinha um único idioma e somente nele Deus era louvado.


Essa questão idiomática mantinha todas as outras nações à parte da história da redenção. A profecia bíblica, contudo, previu o tempo em que todas as línguas adorariam a Deus, como lemos em algumas passagens listadas abaixo.


"Então purificarei os lábios dos povos, para que todos eles invoquem o nome do Senhor e o sirvam de comum acordo. Sofonias 3.9

Depois disso olhei, e diante de mim estava uma grande multidão que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas, em pé, diante do trono e do Cordeiro, com vestes brancas e segurando palmas. E clamavam em alta voz: "A salvação pertence ao nosso Deus, que se assenta no trono, e ao Cordeiro". Apocalipse 7.9,10

No perfeito estado eterno, espera-se que todos os povos falem novamente um único idioma em louvor a Deus, demonstrando que o plano de redenção foi concretizado, resgatando os eleitos do Senhor de todas as nações e línguas.


A Igreja, como povo escatológico, que vive a realidade do futuro na era presente pela virtude do Espírito Santo, foi capacitada por Ele para expressar a grandeza de Deus em diversos idiomas diferentes, sendo a experiência de pentecoste o ponto de partida para essa maravilhosa realidade espiritual.


Ouvindo-se o som, ajuntou-se uma multidão que ficou perplexa, pois cada um os ouvia falar em sua própria língua. Atônitos e maravilhados, eles perguntavam: "Acaso não são galileus todos estes homens que estão falando? Atos 2.6,7

Essa experiência deu a igreja a garantia de que:


  • O evangelho superaria as barreiras entre os povos, não apenas com respeito a linguagem, mas também a própria cultura.

  • No próprio contexto do culto público, essas línguas faladas com o auxílio do dom de interpretação reforçavam que Deus haveria de quebrar todas as divisões entre as pessoas, unindo-as pela verdade universal do evangelho da graça de Cristo.

  • Essa dotação do Espírito permaneceria viva na igreja até a manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo (1 Co 13.9);


Este fenômeno glorioso foi notado de forma clara na Escritura tanto entre judeus (At 2.4), quanto gentios (At 10.44-46).


No contexto desse episódio, Cornélio e os demais gentios não falaram em outras línguas para comunicar o evangelho a outra nacionalidade, mas para demonstrar que, assim como os judeus, eles também estavam "bebendo de um mesmo Espírito" (1 Co 12.13);


"Enquanto Pedro ainda falava, o Espírito Santo desceu sobre todos que ouviam a mensagem. Os discípulos judeus que acompanhavam Pedro ficaram admirados de que o dom do Espírito Santo também fosse derramado sobre os gentios, pois os ouviram falar em outras línguas e louvar a Deus." Atos 10:44-46

Deste modo, a experiência de falar em outras línguas também acontecia no seio da igreja como uma demonstração da unidade entre diversos povos em torno de um único evangelho e um mesmo Espírito.


O mesmo aconteceu com os discípulos de Éfeso. Eles não falaram em outras línguas para comunicar o evangelho, mas para sinalizar que, ao ouvirem o evangelho e crerem, também participavam do mesmo plano de redenção.


Paulo lhes impôs as mãos e o Espírito Santo veio sobre eles, e falaram em línguas e profetizaram. Atos 19:6

Além disso, Paulo identificou claramente em suas igrejas que a oração em línguas era uma forma comum de devoção particular a Deus. Paulo percebia essa prática como uma provisão parcial do Espírito para auxiliar os crentes em sua comunhão com o Senhor e estimula que os cristãos habilitados pelo Espírito façam dessa forma de oração uma prática regular.


Pois, se oro em línguas, meu espírito ora, mas eu não entendo o que estou dizendo. Então, o que devo fazer? Orarei no espírito e também orarei em palavras que entendo. Cantarei no espírito e também cantarei em palavras que entendo. 1 Coríntios 14:14,15

Nem sempre sabemos orar como convém, mas podemos receber soberanamente pelo Espírito a capacidade de nos comunicarmos com o Senhor sem termos que nos preocupar se estamos falando as palavras certas ou pedindo o que convém. Alguns comentaristas citam o texto de Romanos 8.26 como uma demonstração de que a oração particular em línguas é parte da provisão do Espírito para nos dirigirmos ao Senhor.


E o Espírito nos ajuda em nossa fraqueza, pois não sabemos orar segundo a vontade de Deus, mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos que não podem ser expressos em palavras. Romanos 8:26



Corrigindo a nossa experiência com o dom de línguas


Desse modo, perceba que à luz de toda a Escritura, é muito clara a percepção de que o dom de línguas tinha como objetivo:


  • Proclamar a universalidade do evangelho e tornar possível a comunicação da boa notícia à todos os povos;

  • Sinalizar a participação de pessoas de todas as etnias no mesmo corpo de Cristo, pelo mesmo Espírito;

  • Potencializar a relação de comunhão entre a Igreja e o Senhor por meio de uma devoção espiritual e inspirada pelo Espírito.


Com essa percepção dada pela Escritura, precisamos apontar alguns erros que podemos cometer quando praticamos a experiência do falar em línguas em nossos cultos ou devoção particular.


  • Primeiro: o dom de línguas não é evidência obrigatória de que alguém foi cheio do Espírito. Contudo, pessoas que foram cheias do Espirito podem falar em outras línguas;

  • Na Bíblia, as línguas aconteciam em um contexto de evangelização, de unidade espiritual e de devoção particular. Elas não tinham como o objetivo demonstrar superioridade espiritual ou aprovação de Deus a uma vida de hábitos pecaminosos.

  • Não devemos pregar para que os crentes falem em línguas, mas para que os pecadores ouçam o evangelho e se arrependam!

  • Não devo associar a aprovação de Deus a nosso ajuntamento pelas manifestações de línguas desconhecidas. O que determina se Deus aprovou nossos encontros não são essas experiências, mas se Deus foi, de fato, glorificado em tudo o que foi feito.


Dessa forma, como podemos construir uma reflexão bíblica sobre a pertinência e validade dessa experiência em nosso contexto pentecostal reformado?


Vamos analisar essa manifestação sobre duas perspectivas:


  • O dom de línguas na devoção particular

  • O dom de línguas no culto público



O dom de línguas na devoção particular


Entendo como "devoção particular" a vida secreta do discípulo com Deus. Todos nós devemos dedicar esse tempo a sós com Nosso Senhor, atendendo as claras instruções que Jesus deixou aos seus discípulos.


Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará publicamente. Mateus 6:6

Todos precisamos ter vida em secreto com Deus. Cada segundo dedicado a Ele em oração constrói a nossa estatura espiritual e nos habilita a nos submetermos à Sua vontade.


Nessa dinâmica da vida particular de oração, o dom de línguas pode ser um importante aliado de nossa devoção ao Senhor. Muitas vezes, estamos tão sobrecarregados de fardos e temores que nos faltam até palavras para falarmos com Deus.


Nesse instante, o dom de línguas pode ser um recurso para nos concentrarmos não nas palavras que diremos, mas no Deus a quem invocamos.


Pois, se oro em línguas, meu espírito ora, mas eu não entendo o que estou dizendo. 1 Coríntios 14.14

Na oração em línguas o nosso espírito de fato está orando. Não temos plena compreensão de quais palavras estão sendo ditas, mas temos a certeza de que o Espírito dinamicamente torna essas sílabas incompreensiveis em palavras de louvor a Deus.


Porque o que fala em língua desconhecida não fala aos homens, senão a Deus; porque ninguém o entende, e em espírito fala mistérios. 1 Coríntios 14:2

Eu oro em línguas em meus momentos devocionais. Muitas vezes, essa dinâmica torna a minha percepção da minha relação com Deus mais clara. Não foram poucas vezes em que diante de cenários desafiadores, essa ferramenta foi minha aliada para obter vitórias espirituais significativas.


Para aqueles que receberam de Deus esse dom, as línguas são uma forma de edificação espiritual necessária para sua experiência particular com Cristo.


O que fala em língua desconhecida edifica-se a si mesmo (...) 1 Coríntios 14:4a

É necessário, contudo, maturidade do cristão em reconhecer que nem todos receberão de Deus esse dom. A própria Bíblia afirma isso. Um cristão não precisa do dom de línguas para crescer em Cristo e atingir a tão necessária maturidade espiritual. Deus sabe a ferramenta que entrega a cada um dos seus obreiros!


Têm todos dons de curar? Falam todos em línguas? Todos interpretam? 1 Coríntios 12:30

Contudo, entre aqueles que tem recebido de Deus esse dom, devem exercê-lo em sua vida particular, a fim de aprofundarem sua experiência com Cristo em toda a sua plenitude. Se Deus proporcionou-lhe pelo Espírito esse carisma, ele será útil no desenvolvimento de sua fé pessoal em Jesus.


A devoção particular no quarto fechado é o melhor ambiente para a dinâmica da oração em línguas acontecer.


Desse modo irmão, se no seu momento de intimidade você perceber que sua mente inspirada pelo Espírito começou a produzir essa linguagem espiritual, não tenha receio de orar desse modo.



O dom de línguas NO CULTO PÚBLICO


O ambiente do culto público, contudo, não é um impeditivo para que aconteçam orações particulares ou cânticos espontâneos em língua desconhecida. O que muda radicalmente é a dinâmica dessas manifestações.


Conforme aprendemos na mensagem anterior, o culto público deve ser realizado de modo ordeiro tendo em vista a necessidade da edificação de todo o corpo de Cristo e a presença de visitantes não cristãos.


Nesse ambiente, as línguas podem existir em uma dinâmica que envolva a fala inspirada à igreja ou a minha expressão pessoal de louvor a Deus.


Paulo prevê essa condição diferenciando as duas experiências. Veja comigo 1 Co 14.27,28.


Se alguém falar em língua, faça-se isso por dois, ou quando muito três, e cada um por sua vez, e haja um que interprete. Mas, se não houver intérprete, esteja calado na igreja, e fale consigo mesmo, e com Deus. 1 Coríntios 14.27,28

Se a minha fala em outra língua for uma mensagem direcionada à igreja, deve existir na igreja quem interprete a mensagem. Eu já presenciei manifestações de variedade de línguas com intérpretes e é uma das dinâmicas mais lindas entre os dons espirituais. Essa experiência deve ser ordeira, falando um de cada vez, para que exista interpretação e edificação da igreja.


Contudo, pode existir também a devoção particular a Deus durante um culto. Posso me sentir impelido a orar nessa forma espiritual. Nesse caso, a Bíblia ensina: devo falar comigo mesmo e com Deus, isto é, de modo privado.


Por que deve ser assim? Para atendermos as instruções bíblicas de que, num culto público, todos devem ser edificados e para que visitantes não pensem que estamos loucos.


Então, quando formos ler a Escritura, orar, pregar e cantar congregacionalmente, precisamos fazer isso com palavras inteligiveis. Esse é o mandamento de Deus para o culto público para nos dirigirmos à assembleia de crentes.


Todavia na igreja eu antes quero falar cinco palavras com o meu entendimento, para que possa também instruir os outros, do que dez mil palavras em língua. 1 Coríntios 14.19;

Se, pois, toda a igreja se reunir num mesmo lugar, e todos falarem em línguas, e entrarem indoutos ou incrédulos, não dirão porventura que estais loucos? 1 Coríntios 14.23

No nosso cantinho, contudo, nos expressemos de acordo com a vontade do Espírito e com os dons que possuímos. É assim que uma igreja bíblica e carismática funciona!


Eu tenho consciência que para alguns de nossos irmãos pentecostais, a doce lembrança dos cultos agitados, dos 'rététés' e dos explosivos encontros onde muitas pessoas começavam a se manifestar até sem controle pode gerar um 'saudosismo espiritual', mas, a nossa decisão de procurarmos ser uma igreja bíblica deve gerar em nós um posicionamento firme contra esses excessos.


Se Deus afirmou na Escritura que isso não é bom, não é bom mesmo, ainda que pareça ser aos nossos olhos.


Como pentecostais reformados, queremos a espontaneidade em nossas reuniões, mas não a ponto de descumprirmos as instruções de 1 Coríntios 14. Se a dinâmica do Espírito fluir durante um culto e você for contagiado com ela, ore e cante em línguas espirituais de modo privado, sem atrapalhar a liturgia do culto ou chamar atenção para você.


Se a presença for forte demais (usei o linguajar pentecostal propositalmente), se ajoelhe e comece a orar, chorar e se derramar perante o Pai.


Mas, por favor, façamos tudo com ordem e decência.



Conclusão


Como pentecostais que estão reformando a sua fé, entendemos que os excessos e abusos que existem na grande babel que é o evangelicalismo brasileiro devem ser abandonados para vivermos vidas equilibradas diante do Senhor.


Cremos no dom de línguas e queremos experimentá-lo em nossa vida devocional e comunitária.


Mas o nosso foco permanece sendo a cruz!


Diferente das línguas, a mensagem do evangelho é clara e inteligível!


Cristo morreu para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal.


Deus aceitou o sacrifício de Cristo na cruz e o ressuscitou ao terceiro dia para declarar justos aqueles que crêem nEle!


Essa morte é o começo da restauração!


No jardim do Éden havia somente um idioma. No céu, os salvos falarão um único idioma também. Ao dotar a Igreja com esse carisma, o Espírito nos prepara, como povo escatológico, para experimentarmos, parcialmente, aquilo que será perfeito na eternidade!


O poder libertador da cruz restaura a humanidade a uma experiência de unidade. O evangelho nos arranca da vida de pecados e nos traz aos pés do mesmo Jesus, para sermos lavados em um único sangue, para bebermos do mesmo Espírito, sermos adotados pelo mesmo Pai e morarmos no mesmo céu glorioso que Ele preparou para os seus!


Não se embriaguem com vinho, pois ele os levará ao descontrole. Em vez disso, sejam cheios do Espírito, Efésios 5:18

Quer participar disso? Receba Cristo como o Senhor da sua vida!


Pastor Sérgio Fernandes

Pastor Titular da IPR

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1 Comment


Josue Filho
Josue Filho
Dec 13, 2023

Que loucura!

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